HOMEOPATIA:
Ciência, Filosofia e Arte de Curar


Interesse Geral 

O ensino da homeopatia e da acupuntura nas faculdades de medicina - Informativo APH 

O ensino da homeopatia e da acupuntura nas faculdades de medicina - Informativo APH

Teixeira, MZ. O ensino da homeopatia e da acupuntura nas faculdades de medicina. Informativo APH 2004; 16 (90): 10-11.

 

Na última década, a demanda da população mundial por práticas não-convencionais em saúde (PNCS) aumentou substancialmente, exigindo do médico noções básicas das diversas terapêuticas vigentes, a fim de que possa orientar os pacientes que desejem utilizar tratamentos distintos dos que está habituado a empregar.

No Brasil, a homeopatia e a acupuntura são reconhecidas como especialidades médicas desde 1980 e 1995, respectivamente, despertando o interesse de um contingente significativo e crescente de colegas. Segundo pesquisa realizada pelo convênio Fiocruz/ CFM (Perfil dos médicos no Brasil, 1996), a homeopatia, como principal especialidade de atuação, ocupa o 16° maior contingente de profissionais dentre 61 especialidades analisadas, contando com mais de 15.000 médicos praticantes.

Por si só, essas evidências deveriam estimular as faculdades de medicina a propiciarem aos graduandos, residentes e pós-graduandos o conhecimento dos fundamentos teóricos, das evidências científicas e das abordagens terapêuticas empregadas por estas peculiares formas de tratamento.

Com o intuito de esclarecer os colegas e ampliar a discussão sobre o ensino da homeopatia e da acupuntura nas escolas de medicina brasileiras, nos propomos a apresentar o panorama mundial das atitudes da população e da classe médica (estudantes, residentes e especialistas) perante estas terapêuticas, a importância e as iniciativas brasileiras e de outros países no ensino acadêmico destas práticas, e os benefícios que o aprendizado destas concepções holísticas podem trazer à formação generalista dos futuros médicos.

Interesse e Emprego das PNCS pela População Mundial

Eisenberg e cols. estimaram que 42% da população norte-americana faz uso de PNCS, com 629 milhões de consultas anuais a praticantes (excedendo o número total de consultas do sistema primário de saúde dos EUA), representando um custo adicional de US$ 27 bilhões à população americana, por não estarem disponíveis nos serviços públicos de saúde e não serem reembolsadas pelas empresas de seguro médico. (N Eng J Med 1993, 328: 246-52; JAMA 1998, 280: 1569-75)

A insatisfação dos pacientes com a medicina convencional é apontada como a principal justificativa para o aumento progressivo do interesse por terapêuticas não-usuais, seguida pelos efeitos adversos das drogas clássicas e pela busca de uma melhor relação médico-paciente, através de um tratamento que englobe a pessoa em sua totalidade. (JAMA 1998, 279: 1548-53; J R Soc Health 2000, 120: 42-6)

Em 1998, o Congresso dos EUA autorizou a transformação do Office of Alternative Medicine do National Institutes of Health, após seis anos de funcionamento, no National Center for Complementary and Alternative Medicine, promovendo um crescimento exponencial das PNCS no país, disponibilizando, para 2003, um orçamento de US$ 100 milhões para o desenvolvimento de pesquisas nestas áreas.

Atitudes de Médicos e Estudantes de Medicina frente às PNCS

Com o aumento da procura da população por PNCS, os médicos estão começando a sentir a necessidade de suprir esta demanda, desviada nos EUA para os terapeutas práticos não-médicos. Uma metanálise de 12 levantamentos sobre as atitudes de médicos convencionais frente às PNCS mostrou que eles acreditam que as PNCS são moderadamente efetivas. (Arch Intern Med 1995, 155: 2405-8)

Um levantamento sobre a experiência pessoal e comunicação com pacientes frente às PNCS foi respondido por 302 médicos de Denver (Colorado, EUA): 76% dos médicos informaram que tinham pacientes que usavam PNCS, 59% eram questionados sobre PNCS específicas, 48% tinham recomendado PNCS a pelo menos um paciente e 24% tinham usado PNCS pessoalmente. A recomendação de PNCS estava fortemente associada com a utilização da terapêutica em si próprios. Poucos médicos sentiam-se confortáveis em discutir PNCS com seus pacientes e a maioria (84%) acreditava que precisariam aprender mais sobre PNCS, para enfocar as preocupações dos pacientes adequadamente. (Arch Intern Med 2002, 162: 1176-81)

Numa pesquisa realizada com 592 acadêmicos de medicina da Universidade de Glasgow (Reino Unido), 77% dos entrevistados consideraram que as PNCS eram úteis, com 69% mostrando-se favoráveis à inclusão das mesmas no currículo fundamental. (Compl Ther Med 1993, 1suppl: 32-3).

Levantamento feito com 204 estudantes de medicina da Universidade de Marburg (Alemanha) evidenciou alto interesse dos entrevistados (80%) no aprendizado de PNCS, que pretendiam utilizá-las na sua futura prática médica (homeopatia: 45%; acupuntura: 42%; fitoterapia: 33%). (Forsch Komp 1997, 5: 284-91).

Em vista do alto interesse despertado nos estudantes de medicina dos EUA, a Association of American Medical Colleges declarou que os mesmos devem ter conhecimento suficiente sobre PNCS, para que estejam aptos a aconselhar seus futuros pacientes a respeito dos possíveis benefícios e malefícios de cada terapêutica. (Acad Med 2000; 75: 571)

Concomitante à incorporação das disciplinas eletivas de homeopatia e de acupuntura ao currículo da FMUSP, em 2002, realizamos um levantamento junto a 484 estudantes da Casa de Arnaldo, evidenciando que mais de 85% dos entrevistados consideravam que a homeopatia e a acupuntura deveriam estar inseridas no currículo da graduação das escolas de medicina (opcional: 72%; obrigatória: 19%), com 56% mostrando-se bastante interessados no aprendizado. Apesar de nenhum ou pouco conhecimento no assunto (76% em média), 67% dos estudantes creditavam algum grau de eficácia às mesmas, tendo como principais indicações as doenças crônicas (isoladamente: 37%; englobando também as doenças agudas: 29%). Ao redor de 35% dos acadêmicos foram favoráveis ao oferecimento ambulatorial das especialidades nos serviços públicos de saúde, enquanto que a média de 34% defendia a disponibilização destes tratamentos também em hospitais, com 60% acreditando na possibilidade de integração com a prática médica convencional.

Importância do Ensino de PNCS para a Classe Médica

A maioria da classe médica não está apta a responder perguntas ou orientar seus pacientes frente às PNCS, no que tange aos mecanismos de ação, indicações terapêuticas, interações medicamentosas e efeitos adversos destas terapêuticas. (J Community Health 2001, 26: 159-74)

Fatores adicionais como o diálogo pobre e inadequado entre médicos convencionais e médicos de PNCS, dúvidas sobre a competência de tais profissionais (pela falta de qualificações prontamente identificáveis e reconhecíveis) e o risco de oferecimento de esperança irreal de cura, colocam o paciente dentro de uma posição incerta frente às terapêuticas não-convencionais. A incorporação sistemática de informações sobre PNCS nos currículos das escolas médicas, com as evidências científicas que respaldam tais tratamentos, além de diminuir o preconceito existente, proveria os médicos futuros com as ferramentas e o conhecimento necessários para permitir que os seus pacientes possam se beneficiar adequadamente das PNCS, com riscos limitados. (Acad Med 2000, 75: 572-3)

À medida que forem incorporadas aos currículos das escolas médicas, projetos de pesquisa nas áreas básica e clínica serão elaborados, como necessidade de complementação acadêmica ao ensino da homeopatia e da acupuntura, propiciando, através de protocolos específicos que contemplem as premissas fundamentais de cada modelo, uma maior compreensão científica destes paradigmas diversos.

Estimativas Mundiais do Ensino Médico em PNCS

No período de 1997-1998, uma pesquisa em 117 escolas médicas americanas evidenciou que 64% ministravam aulas sobre PNCS. (JAMA 1998, 280: 784-7)

Em 1998, levantamento realizado junto às escolas médicas do Canadá mostrou que 81% delas haviam incorporado tópicos de PNCS ao seu currículo. (Can Med Assoc J 1999, 160: 816-7)

Em 1999, um levantamento mostrou que 40% das escolas médicas da União Européia ofereciam cursos de PNCS. (J Altern Complement Med 2001, 7: 337-43)

No Brasil, a homeopatia e a acupuntura estão incorporadas aos projetos de ensino, como disciplinas optativas, em 11 e 8 faculdades de medicina, respectivamente, com carga horária média de 60 horas-aula. Além dos cursos de especialização lato sensu, única forma de ensino supervisionado destas especialidades no país, projetos de residência médica começam a ser discutidos pelas entidades de classe e o Conselho Nacional de Residência Médica (CNRM).

Perante o cenário mundial, apesar da homeopatia e da acupuntura brasileiras apresentarem uma situação privilegiada (reconhecidas como especialidades médicas, disponíveis em serviços públicos de saúde, reembolsadas pelos seguros-saúde, com seus procedimentos regulamentados pela Agência Nacional de Saúde, etc.), não estão inseridas no currículo da maioria das escolas médicas brasileiras, privando a classe médica do conhecimento dos preceitos básicos, da experiência clínica e das pesquisas científicas existentes nestas áreas, gerando críticas e preconceitos que se perpetuam pela ausência de informação.

Esboçando uma síntese do panorama global da importância e do interesse no ensino acadêmico de terapêuticas não-usuais, esperamos evidenciar a necessidade de adequação das faculdades de medicina brasileiras às crescentes iniciativas mundiais nesta área, incorporando à formação médica tradicional o ensino regular e gradativo da homeopatia e da acupuntura, especialidades médicas que ampliam o entendimento da individualidade humana enferma, favorecem a relação médico-paciente, incrementam a resolutividade clínica das doenças modernas e isentam os pacientes dos efeitos indesejáveis das drogas clássicas, permitindo que a integração das diversas práticas terapêuticas vigentes ampliem a mais elevada e única missão do médico, que é tornar saudáveis as pessoas doentes, o que se chama curar.

 

Referência Bibliográfica

Teixeira MZ, Lin CA, Martins MA. O ensino de práticas não-convencionais em saúde nas faculdades de medicina: panorama mundial e perspectivas brasileiras. Revista Brasileira de Educação Médica 2004; 28(1): 51-60. Disponível em: http://www.educacaomedica.org.br/UserFiles/File/2004/volume28_1/ensinos_de_praticas.pdf.

 



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